My Way - Mars - Gun's... Canções que tocam a minha ALMA (seleção csl)

quarta-feira, 28 de setembro de 2011

Frescobol - Conversarei com você até a nossa velhice, tranquilamente.

Texto meu (csl):


                                  (csl) Rubem Alves é um escritor que eu admiro, a considerar a forma como ele coloca as suas idéias no papel, bem como por suas entrevistas que eu já tive oportunidade de assistir, enfim sobre os temas de que ele se põe a refletir, e disseminar com tamanha eloquencia.

                                          Na fase que eu estou, com os meus 42 anos, absurdamente bem vividos, nada tenho a reclamar da vida, fui agraciado por diversas formas na minha caminhada, tenho sido, em especial nesta nova fase da minha vida.

                                          Em determinados momentos, em especial na fase imatura, julgamos o sexo mais importante, que qualquer coisa em uma relação, eu mesmo sempre pensei desta forma, ou seja, uma relação que não tivesse sexo que atendesse as minhas expectativas, estaria fadada a morrer rapidamente, e é lógico que sexo é importante, é maravilhoso e eu continuo gostando, e o meu corpo e mente reagem bem a esta situação, mas refletindo um pouco quando eu pensava em quanto por cento o sexo é importante em uma relacao, na realidade não era esta a questão, e eu sempre rotulava como tendo que ser algo para lá de 80%.

                                          A realidade é que eu não estava me referindo efetivamente ao sexo, e sim a intimidade do casal, esta sim tem que ser para lá de 80%, pois o sexo em sí, regra geral, lógico não podemos generalizar, com certeza em certa fase de nossas vidas, não será tão eloquente quanto aos 25 anos ou por exemplo na fase em que eu estou. Mas a intimidade esta jamais poderá perder o seu grau de relevância.

                                          Já ouvi falar muito sobre que um casamento será duradouro, se soubermos engolir muitos sapos, bem como se a pessoa com quem escolhermos ficar pelo resto da vida, se consegueríamos vislumbrar ouvi-la até o fim de nossos dias, ou seja, travar um diálogo agradável, que não chateie nem um, nem o outro.

                                          Hoje me deparei com o texto abaixo, pertinente ao que eu escrevo acima, trago-o para compartilhar, seu título é Tênis e Frescobol. (csl).



Depois de muito meditar sobre o assunto concluí que os casamentos são de dois tipos: há os casamentos do tipo tênis e há os casamentos do tipo frescobol. Os casamentos do tipo tênis são uma fonte de raiva e ressentimentos e terminam sempre mal. Os casamentos do tipo frescobol são uma fonte de alegria e têm a chance de ter vida longa.

Explico-me. Para começar, uma afirmação de Nietzsche, com a qual concordo inteiramente. Dizia ele: ‘Ao pensar sobre a possibilidade do casamento cada um deveria se fazer a seguinte pergunta: ‘Você crê que seria capaz de conversar com prazer com esta pessoa até a sua velhice?\' Tudo o mais no casamento é transitório, mas as relações que desafiam o tempo são aquelas construídas sobre a arte de conversar.


Xerazade sabia disso. Sabia que os casamentos baseados nos prazeres da cama são sempre decapitados pela manhã, terminam em separação, pois os prazeres do sexo se esgotam rapidamente, terminam na morte, como no filme O império dos sentidos. Por isso, quando o sexo já estava morto na cama, e o amor não mais se podia dizer através dele, ela o ressuscitava pela magia da palavra: começava uma longa conversa, conversa sem fim, que deveria durar mil e uma noites. O sultão se calava e escutava as suas palavras como se fossem música. A música dos sons ou da palavra - é a sexualidade sob a forma da eternidade: é o amor que ressuscita sempre, depois de morrer. Há os carinhos que se fazem com o corpo e há os carinhos que se fazem com as palavras. E contrariamente ao que pensam os amantes inexperientes, fazer carinho com as palavras não é ficar repetindo o tempo todo: ‘Eu te amo, eu te amo...’ Barthes advertia: ‘Passada a primeira confissão, ‘eu te amo\' não quer dizer mais nada.’ É na conversa que o nosso verdadeiro corpo se mostra, não em sua nudez anatômica, mas em sua nudez poética. Recordo a sabedoria de Adélia Prado: ‘Erótica é a alma.’

O tênis é um jogo feroz. O seu objetivo é derrotar o adversário. E a sua derrota se revela no seu erro: o outro foi incapaz de devolver a bola. Joga-se tênis para fazer o outro errar. O bom jogador é aquele que tem a exata noção do ponto fraco do seu adversário, e é justamente para aí que ele vai dirigir a sua cortada - palavra muito sugestiva, que indica o seu objetivo sádico, que é o de cortar, interromper, derrotar. O prazer do tênis se encontra, portanto, justamente no momento em que o jogo não pode mais continuar porque o adversário foi colocado fora de jogo. Termina sempre com a alegria de um e a tristeza de outro.

O frescobol se parece muito com o tênis: dois jogadores, duas raquetes e uma bola. Só que, para o jogo ser bom, é preciso que nenhum dos dois perca. Se a bola veio meio torta, a gente sabe que não foi de propósito e faz o maior esforço do mundo para devolvê-la gostosa, no lugar certo, para que o outro possa pegá-la. Não existe adversário porque não há ninguém a ser derrotado. Aqui ou os dois ganham ou ninguém ganha. E ninguém fica feliz quando o outro erra - pois o que se deseja é que ninguém erre. O erro de um, no frescobol, é como ejaculação precoce: um acidente lamentável que não deveria ter acontecido, pois o gostoso mesmo é aquele ir e vir, ir e vir, ir e vir... E o que errou pede desculpas; e o que provocou o erro se sente culpado. Mas não tem importância: começa-se de novo este delicioso jogo em que ninguém marca pontos...

A bola: são as nossas fantasias, irrealidades, sonhos sob a forma de palavras. Conversar é ficar batendo sonho pra lá, sonho pra cá...

Mas há casais que jogam com os sonhos como se jogassem tênis. Ficam à espera do momento certo para a cortada. Camus anotava no seu diário pequenos fragmentos para os livros que pretendia escrever. Um deles, que se encontra nos Primeiros cadernos, é sobre este jogo de tênis:

‘Cena: o marido, a mulher, a galeria. O primeiro tem valor e gosta de brilhar. A segunda guarda silêncio, mas, com pequenas frases secas, destrói todos os propósitos do caro esposo. Desta forma marca constantemente a sua superioridade. O outro domina-se, mas sofre uma humilhação e é assim que nasce o ódio. Exemplo: com um sorriso: ‘Não se faça mais estúpido do que é, meu amigo\'. A galeria torce e sorri pouco à vontade. Ele cora, aproxima-se dela, beija-lhe a mão suspirando: ‘Tens razão, minha querida\'. A situação está salva e o ódio vai aumentando.’

Tênis é assim: recebe-se o sonho do outro para destruí-lo, arrebentá-lo, como bolha de sabão... O que se busca é ter razão e o que se ganha é o distanciamento. Aqui, quem ganha sempre perde.

Já no frescobol é diferente: o sonho do outro é um brinquedo que deve ser preservado, pois se sabe que, se é sonho, é coisa delicada, do coração. O bom ouvinte é aquele que, ao falar, abre espaços para que as bolhas de sabão do outro voem livres. Bola vai, bola vem - cresce o amor... Ninguém ganha para que os dois ganhem. E se deseja então que o outro viva sempre, eternamente, para que o jogo nunca tenha fim...
(...)
 
Rubem Alves


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